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domingo, 6 de junho de 2010

CRÔNICA DA SEMANA - ABDOMINOPLASTIA

Olá, Leitor (a),


Enfrentar uma cirurgia não é fácil.
E cada vez mais mulheres buscam este procedimento
para atingir o que julgam ideal de corpo.

Contudo, deve-se ter cuidado... para não se escravizar.

Abraços,

Ronaldo






                                                            ABDOMINOPLASTIA*





Um ditado a sacudia mais que a tensão pré-operatória. Trata-se da frase que ouvia quando criança: quem não tem o que fazer, inventa. Tinha a nítida impressão que a vontade que a motivara para estar ali prestes a ter o estômago rasgado era fútil, coisa de quem não tem o que fazer. Mas agora não dava para recuar.



Por que recuaria? Basta lembrar o que a motivou. Que se recorde, nunca tivera um corpo escultural. Contudo, depois da gravidez, a situação de sua barriga se complicou. Se aos vinte anos tinha orgulho de colocar um biquíni ou qualquer peça que deixasse a barriga à vista, mal chegou aos trinta para a decepção ofuscar o prazer de ir à praia.






Torturava-se. À praia, quando acontecia de ir, tinha poucas opções. O maiô se impôs de vez, sem espaço para os shortinhos muito menos para os biquínis. Ainda vinha rodeado de uma toalha, que a moda chama de canga. Entrar na água, que tormento. Tinha que tirar a canga e, envergonhada, ir-se timidamente para água. O alívio vinha quando submersa. Ali, todas eram iguais: jovenzinhas esbeltas e mulheres mais fofinhas.





A tortura não para por aí. A presença do marido igualmente a oprimia. Sim, ele é super gentil. “Imagina! Você não está gorda. Pelo contrário, está no ponto”. Estas palavras amenizavam, mas nem de longe resolviam o problema. Ele a ama. Nota-se. Mas era homem, insistia ela. Como não vê que os olhos dele quase sem querer seguem os ventres mais salientes que desfilam a beira-mar. Punha a mão no fogo por ele, que jamais seria traída. Como impedir, contudo, o estrago da comparação, ainda que não admitida, sequer percebida pelo marido, diante das outras mais atraentes.



Por vezes sentia que era injusta com seu corpo e com seu marido. O primeiro sadio, sempre a manteve longe dos médicos. Forte, que a possibilitava inclusive fazer caminhadas e andar de bicicleta como exercícios diários. O segundo, homem carinhoso, honesto e incentivador, tudo de bom. Por que então as idéias lhe perturbavam.




O que a fazia sofrer era a impressão de que não era atraente suficientemente para si nem para seu marido. Esse pensamento a perturbou tanto, tanto, que não teve jeito. Apelou para a cirurgia. Não fora de uma hora, claro. Havia anos que ouvira falar na abdominoplastia. Outros tantos anos passou conjeturando se deveria ou não se submeter.



Após a cirurgia, vai para o quarto. Um grande corte à altura da cintura de uma ponta a outra, dá mostra que a intervenção cirúrgica profunda e agressiva requerer um bom tempo de repouso. Com a cabeça ainda dopada, horas mais tarde despertaria com a sensação de dever cumprido.


*ronaldo duran, escritor, colabora em jornais brasileiros. Visite o autor nas páginas do google.