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sexta-feira, 3 de abril de 2009



DUAS FALÁCIAS QUE DEVEMOS EVITAR [1]



por Satoshi Kanazawa[2], 19/10/2008.





Em toda discussão sobre a psicologia evolucionista, ou sobre as ciências humanas em geral, é muito importante evitar duas falácias lógicas. São as chamadas falácias naturalista e moralista.

A falácia naturalista, assim denominada pelo filósofo inglês George Edward Moore, no início do século XX, ainda que primeiramente identificada muito mais cedo pelo filósofo escocês David Hume, é o salto do é para o deve ser - é a tendência em acreditar que o que é natural é bom; que o que é, deve ser. Por exemplo, pode-se cometer o erro da falácia naturalista ao dizer, “porque as pessoas são geneticamente diferentes e dotadas com diferentes habilidades e talentos inatos, devem ser tratadas diferentemente”.

A falácia moralista, cunhada pelo microbiologista Bernard Davis, de Harvard, nos anos 70, é o oposto da falácia naturalista. Refere-se ao salto do deve ser para o é, é a reivindicação para que as coisas sejam do modo que deveriam ser. Esta é a tendência em acreditar que o que é bom é natural, que o que deve ser, é. Por exemplo, pode-se cometer o erro da falácia moralista ao dizer, “porque todos devem ser tratados igualmente, não há nenhuma diferença genética inata entre as pessoas”. Matt Ridley, o extraordinário escritor científico, a chama de o reverso da falácia naturalista.

Ambas são falácias lógicas, e entram no caminho do progresso da ciência em geral, e no da psicologia evolucionista em particular. Entretanto, como Ridley perspicazmente observa, políticos conservadores têm maior probabilidade de cometer a falácia naturalista (“A natureza projetou os homens para serem competitivos, e as mulheres para educarem filhos, assim as mulheres devem ficar em casa cuidando das crianças e deixar a política aos homens"), enquanto os políticos mais liberais podem igualmente cometer a falácia moralista (“Os princípios democráticos ocidentais sustentam que os homens e as mulheres devem ser tratados igualmente perante a lei, portanto, homens e mulheres são biologicamente idênticos e todo estudo que demonstrar outra coisa é a priori falso").

Uma vez que os acadêmicos - e os cientistas sociais em particular - são em sua grande maioria de esquerda, a falácia moralista tem sido um problema muito maior nas discussões acadêmicas da psicologia evolucionista do que a falácia naturalista. A maioria dos acadêmicos está longe de cometer a falácia naturalista, mas não de cometer a falácia moralista. A recusa teimosa de cientistas sociais em aceitar diferenças de sexo e de raça no comportamento, temperamento, e nas habilidades cognitivas, e sua tendência de serem cegos à realidade empírica dos estereótipos, reflete sua falácia moralista conduzida por suas convicções políticas.
É realmente muito fácil evitar ambas as falácias - ambos saltos da lógica - simplesmente nunca falando sobre o que deve ser, mas somente falando sobre o que é. Não é possível cometer a falácia naturalista ou a moralista se os cientistas nunca falarem o que deve ser. Os cientistas - cientistas mesmo - não tiram conclusões e implicações morais das observações empíricas que fazem, e não são guiados em suas observações por princípios morais e políticos. Os verdadeiros cientistas definitivamente não se importam com o que deve ser.

Há somente dois critérios legítimos pelos quais se avaliam idéias e teorias científicas: lógica e evidência. Portanto, você pode justificadamente criticar teorias da psicológica evolucionista (ou algumas outras teorias na ciência) se elas apresentarem inconsistência lógica internamente, ou se houver prova científica digna de crédito contra elas. Como um cientista, um fundamentalista científico, considero seriamente tais críticas. Entretanto, você não pode criticar teorias científicas, minhas ou de outros, simplesmente porque suas implicações são imorais, feias, contrárias a nossos ideais, ou ofensivas a alguém ou a tudo. Como os leitores regulares deste blog bem sabem, as implicações de muitas das idéias científicas e teorias, minhas ou de outros, são certamente imorais, feias, contrárias a nossos ideais, ou ofensivas tanto aos homens quanto às mulheres (ou a outros grupos de pessoas). Eu simplesmente não me importo. Se o que eu digo é errado (porque é ilógico ou falta credibilidade científica à evidência), aí é meu problema. Se o que eu digo o ofende, é seu problema.

A verdade é o único princípio orientador na ciência, e é a coisa mais importante para todos os cientistas. Sem dúvida, é a única coisa importante; nada mais importa na ciência além da verdade. Entretanto, eu também acredito que toda solução para um problema social deve começar com a correta avaliação do problema em si e suas possíveis causas. Nós nunca poderemos planejar uma solução correta para um problema se não soubermos quais são suas causas de fato. Assim, observações fiéis são fundamentos importantes da ciência pura, e também da política social, se você se importa com a resolução dos problemas sociais, o que, é claro, não é meu campo de atuação.




Pesquisa e tradução: Marcos Brunini (marcosbrunini@yahoo.com.br), psicólogo, especialista técnico, formador do Centro de Extensão e Aperfeiçoamento – Escola para Formação e Capacitação Profissional – Fundação CASA.
São Paulo – SP, janeiro de 2009.

[1] Two logical fallacies that we must avoid, disponível em http://blogs.psychologytoday.com/blog/the-scientific-fundamentalist/200810/two-logical-fallacies-we-must-avoid, acessado em 16/01/2009

[2] Satoshi Kanazawa, psicólogo evolucionista na London School of Economics and Political Science e coautor (com Alan S. Miller) de Por Que Homens Jogam e Mulheres·Compram Sapatos - Como A Evolução Molda Nosso Comportamento. Rio de Janeiro: Prestigio Editorial. 2007.