Satoshi Kanazawa[2], 10/07/2008.
Nos últimos dois posts (parte I e parte II), explico a lógica psicológica evolutiva por trás da criminalidade masculina, o porquê de os homens em sociedades polígamas serem compelidos a se envolverem em crimes contra pessoas e contra a propriedade a fim de obterem o acesso reprodutivo às mulheres. Ainda que a maioria esmagadora dos criminosos em todas as sociedades humanas sejam homens, há algumas exceções - algumas mulheres cometem crimes. Dada a lógica psicológica evolutiva, entretanto, por que as mulheres cometeriam crimes?
O psicólogo evolucionista que mais tem trabalhado para explicar a criminalidade feminina é a professora Anne Campbell, da Universidade de Durham, no Reino Unido. Ela oferece a teoria “ficar viva” para explicar a criminalidade feminina. Sua teoria começa com a observação basilar de que a sobrevivência da prole, e por consequencia o sucesso reprodutivo, depende mais pesadamente do cuidado e do investimento materno do que do paterno. É, portanto, imperativo para as mães, mais do que para os pais, sobreviver o suficiente para fornecer os cuidados físicos a sua prole, assegurando dessa forma sua sobrevivência até a maturidade sexual. Por isso, Campbell discute, as mulheres são mais avessas aos riscos do que os homens. O benefício potencial de assumir riscos – envolvendo-se em competição física por recursos e companheiros, por exemplo -- simplesmente não justifica o custo potencial (a sobrevivência mesma da prole, bastante articulada à própria sobrevivência da mãe). Assim, o objetivo fundamental de uma mulher é permanecer viva para suas crianças.
Campbell nota, entretanto, que ocasionalmente as mulheres precisam competir por recursos e companheiros, especialmente quando são escassos. Eis porque as mulheres competem às vezes por “poucos bons homens” e podem até recorrer à violência e ao roubo para conseguir seus objetivos, mesmo que, coerentes com seu objetivo primeiro de ficarem vivas, suas táticas de competição sejam geralmente de baixo-risco (furto e não roubo, que envolve ameaça ou violência) e indiretas (espalhar boato negativo sobre uma rival em questões românticas, pelas suas costas, ao invés do confronto físico direto com a rival).
Em seu trabalho mais recente, Campbell vai mais longe à integração teórica da criminalidade masculina e feminina. Argumenta que os homens e as mulheres não diferem quanto aos benefícios da agressão: os homens de elevado status que são vencedores da competição masculina podem ter acesso a companheiras, e assim a mais oportunidades de sexo, mas as mulheres de elevado status que são vencedoras da competição feminina podem ter prioridade de acesso aos recursos e à maior proteção concedida por homens de elevado status. Ou seja, Campbell argumenta que mulheres devem competir por companheiros de alta qualidade tanto quanto os homens. Portanto, é somente o custo da agressão que distingue homens e mulheres, explicando a incidência bem mais baixa da agressão entre mulheres.
Campbell indica que o “furto por mulheres geralmente está atrelado às necessidades econômicas e ocorre como parte de suas responsabilidades domésticas por suas crianças”, ao passo que o “roubo é um crime masculino quintessencial, em que a violência é usada para extrair recursos e também para ganhar status”. Aparte sua tendência e inclinação em evitar, de modo geral, riscos e perigos físicos, esta é outra razão pelas quais as mulheres cometem menos crimes do que os homens. As mulheres roubam somente o que precisam para que elas e suas crianças sobrevivam, enquanto os homens roubam para se exibirem e obterem, além dos recursos, status. Ou seja, as mulheres roubam menos do que os homens exatamente porque obtém menos do que eles. As mulheres lucram geralmente menos do que os homens porque tendem a fazer somente o necessário, e geralmente têm coisas melhores a fazer do que ganhar dinheiro, enquanto que os homens são motivados a obter bem mais do que necessitam para sobreviver a fim de usar o dinheiro para atrair mulheres. Similarmente, as mulheres roubam menos do que os homens porque tendem a roubar o que precisam para sobreviver e não usam o crime para outras finalidades, como se exibir e ganhar status.
Concluirei esta série com o post seguinte, mostrando um ‘causo’ pessoal que ilustra perfeitamente o ponto apresentado por Campbell.
Pesquisa e tradução: Marcos Brunini (marcosbrunini@yahoo.com.br)
São Paulo – SP, janeiro de 2009.
[1] Why are almost all criminals men? Part III, disponível em http://blogs.psychologytoday.com/blog/the-scientific-fundamentalist/200807/why-are-almost-all-criminals-men-part-i, acessado em 06/01/2009
[2] Satoshi Kanazawa, psicólogo evolucionista, leciona na London School of Economics and Political Science e é coautor (com Alan S. Miller) de Por Que Homens Jogam e Mulheres·Compram Sapatos - Como A Evolução Molda Nosso Comportamento. Rio de Janeiro: Prestigio Editorial. 2007.
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