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sábado, 6 de março de 2010

educação - nelson valente*

QUE SE LÊ POUCO, EM NOSSO PAÍS, NÃO HÁ MENOR DÚVIDA.


(*) Nelson Valente


O assunto é recorrente e retorna, quando estamos às voltas com a revolução da educação, discutindo sua gênese e os seus objetivos. Na educação superior, uma das provas mais importantes e decisivas do exame vestibular é a redação, primeira manifestação dos educadores no sentido de acabar com a prevalência das provas totalmente baseadas na múltipla escolha ( as famigeradas cruzinhas).
A conclusão é óbvia: sem leitura, como escrever adequadamente? O primeiro passo é mesmo a entrega de voluptuosa aos livros, sobretudo os nossos clássicos, sem esquecer os jornais e revistas também podem ser fundamentais.
Criar o hábito ( ou gosto) pela leitura é um primeiro passo que depende basicamente de pais e professores. Há uma idade para isso, que infelizmente para os calouros não coincide com os seus 17 ou 18 anos. Começa antes, na altura ainda do ensino fundamental. Depois, é só alimentar a cabeça de bons produtos, a fim de que persista o interesse.
No vestibular, em geral, caem temas da atualidade. O penta do Brasil no futebol, as forças armadas no combate ao crime, o avanço da Aids, os salários dos professores, a busca da profissão ou a esperança que cerca a vinda de um novo presidente da República. Quem estiver devidamente preparado, com a base que é fornecido por uma leitura constante, não terá dificuldade de desenvolver o tema da prova. Terá desenvoltura e – o que é mais importante – uma riqueza vocabular essencial. A capacidade de expressão vem daí.
Uma saudável epidemia tomou conta da imprensa brasileira. Os grandes jornais publicam alentadas seções de valorização da língua portuguesa, que alguns até ajudam a abastardar com sua crônica e indesculpável falta de cuidado. Quando sai na manchete do jornal que “Ronaldinho marca gol de placa na Espanha”, não há quem se choque com o lamentável cacófato antes que a página seja definitiva impressa?
Em primeiro lugar, pode-se registrar o fato, facilmente comprovável, de que nunca se escreveu e falou tão mal o idioma de Ruy Barbosa e Jânio Quadros. Culpa, quem sabe, da deterioração do nosso sistema de educação básica.
Em segundo, o pouco apreço que devotamos ao gosto pela leitura.
Em terceiro lugar, para não ir muito longe, podemos citar a “contribuição” dos meios televisivos. Donos de uma força descomunal, salvo as exceções de praxe, como os programas gerados pela TV Cultura de São Paulo, praticam um magistral desserviço à educação brasileira. Comunicadores falam mal, atores não se expressam adequadamente, dublagens são feitas de forma chula, programas infantis deseducam - o que se pode esperar desse triste universo?
Sabe-se que temos hoje 19 milhões de analfabetos, 20 milhões de semi-analfabetos e 40 milhões de analfabetos funcionais – o iletrismo ( são aqueles que aprenderam a ler e não leem) . Pela definição da Unesco, “iletrado pode ser o que aprendeu a ler e a escrever, mas perdeu a prática, ao ponto de não poder mais compreender um texto simples relacionado à sua vida cotidiana”. É o fenômeno do iletrismo, que se distingue do analfabetismo, que é a não-aprendizagem da leitura e da escrita.
Que se lê pouco , em nosso País, não há menor dúvida. Nossa média é de menos de dois livros por habitante. Nos países desenvolvidos é de 6 ou 7, como acontece na França e na Alemanha. Temos uma longa caminhada nessa área, até chegar, por exemplo, perto do que ocorre nos Estados Unidos, onde o consumo “per capita” de livros é de 10 por ano. Será que um dia chegaremos lá ?
O curioso é que, vez por outra, aparece algum vereador interessado em ensinar às nossas crianças a biografia dos homenageados, o que, aliás, é uma boa ideia. Pelo menos um resumo poderia ser colocado na primeira placa de rua. Se isso é de grande utilidade, mais importante ainda é escrever os nomes de maneira correta. Respeitar a nossa língua é uma forma de fazer educação.
Concluindo, o brasileiro está oco. Não é só a ideia da religião, da crença em Deus ou em determinada igreja. Mas está ligado ao pensamento abstrato, à filosofia, ao homem pensando em sua sorte, de onde veio, para onde vai. Essa carência prejudica a cultura geral do indivíduo, porque o homem é essencialmente linguagem. O brasileiro está oco com a língua portuguesa.
Se o jovem não se der bem no vestibular, não há de ser nada. De toda maneira, terá lido alguns dos nossos melhores livros. O que é sempre saudável.
Portanto, há um enorme desafio para reverter esse quadro, exigindo maior atenção das pessoas responsáveis deste País.


*Professor universitário, jornalista e escritor. nelsonvalenti@hotmail.com>

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